A quantidade de pessoas com este tipo de bloqueio é enorme. E isso corrói as suas vidas de forma silenciosa, no trabalho, na família e principalmente nos relacionamentos amorosos.
Este tipo de dor é, portanto, tão legítima quanto comum, nos tempos actuais.
Aliás, verifico que hoje em dia – provavelmente desde sempre, mas cada vez mais – aquilo de que as pessoas sentem verdadeiramente falta é de conexão verdadeira umas com as outras, e a um nível semelhante, de intimidade emocional.
Porém, e contrariamente, a intimidade física nunca foi tão fácil. “Ligarmo-nos” virtualmente também, afinal, está apenas à distância de clique… Mas lá está, o que escasseia na vida de um número gigantesco de pessoa é a uma ligação real, autêntica, a vivência de vínculos sustentados e de relações recíprocas e satisfatórias.
Muitas pessoas, especialmente no contexto das grandes cidades, são assaltadas por uma certa cultura do desapego (para não dizer do descarte mesmo).
Logo, a necessidade das pessoas sentirem - justamente - necessidade de pessoas parece ser vista como algo problemático, da ordem da dependência emocional, passível de dar uma certa pena e geralmente tratado como carência afectiva.
Porém, permita-me que coloque uma nova perspectiva e que lhe conte uma outra história.
Esta é a sua, a minha, a nossa história e a de toda a humanidade. Uma história feita de pele, de toque, de relação, “da” relação que nos deu vida. E por isso fizemo-nos disso: da relação. É dela que viemos e é ela que tendemos a buscar; e é através delas, das relações, que crescemos e nos constituímos. E porquê?
Porque todos nós nascemos tácteis. Olhamos, tocamos, cheiramos, abocanhamos e lambemos tudo o que vemos à frente e, sobretudo quando somos crianças pequenas, a vida apreende-se através dessa possibilidade potencial e apetitosa que são os sentidos à flor do tacto, à flor da pele, palpados, e, no começo dos começos, muito disso surge através do(a) “outro(a)”. A natureza foi sábia, pois sabendo da importância da reciprocidade e da “relação” na formação primária do nosso psiquismo, fez os pequeninos simplesmente adoráveis, bochechudos, bons para pegar, para estrafegar, olhar, brincar, mimar, enfim. Só depois, um bom tempinho depois, aprendemos a conquistar níveis cada vez mais complexos de autonomia, a usar as palavras para nos expressarmos, a esboçar os primeiros pensamentos e sistemas de crenças e – a pouco e pouco – vamos cada vez mais entrando num mundo onde não nos basta apenas existir para “termos” suporte e carinho. E começamos perceber que precisamos “merecer” isso.
Ora, no tocante a este ponto (do “merecimento” de afecto) os critérios são na maior parte dos casos absolutamente arbitrários e aí é que a porca torce o rabo e que os problemas começam.
Inconscientemente, começamos a desenvolver “truques” para obter a aprovação dos outros, e neste tipo de habilidade cada um desenvolve a sua: ser bonzinho, ser submisso, ser bem-disposto e humorado, ser bravio, carente ou fofo, ser rude ou do contra, lá está, aquilo que “sequestrar” a atenção das outras pessoas (especialmente, as pessoas/figuras significativas com poder emocional sobre nós) torna-se uma espécie de moeda de troca para esse intercâmbio chamado relações/“ligações” humanas.
Por outro lado, quando a procura e a oferta são claramente desproporcionais, o que nos obriga a enfrentar períodos mais áridos e outros de total escassez, acabamos por desenvolver uma espécie de “autonomia” forçada em que progressivamente já não esperamos mais nada de ninguém por um motivo bastante legítimo mas secreto: o medo de pedir e não obter nada em troca.
Diga-me: podia cantar ou declamar sozinha a sua canção preferida e não ter de se a ver com os outros (“esses” que estão do lado de lá do palco)?
Bem, poder, podia… mas não seria a mesma coisa.
O que acontece na maior parte das histórias é que uma pessoa já não (se) dá porque tem a perspectiva de não receber; não pede ajuda porque espera desapoio, não se ampara porque tem o desamparo como certo e nem chega a dizer “Olá” porque não concebe que possa sequer ser ouvida (e vista) pelo outro.
Dependendo do quanto fomos (ou percepcionámos que fomos) negligenciados, toda a vida passa a ser uma crença – reafirmada uma e outra vez – de que não precisamos ou gostamos dos outros.
Sabe aquela fábula da raposa, que uma vez que não conseguia alcançar aquele cacho convidativo de uvas que tanto desejava, acaba por virar costas, sair e dizer: “ah, mas são verdes… eu nem queria!”. Querer, a raposa bem que as queria, só não podia admitir a inaptidão para alcançar as uvas, então, convence-se que não queria.
O provérbio português "quem desdenha quer comprar" é comummente associado a esta fábula e em “psicologuês” corrente este comportamento é descrito como racionalização (embora seja mais conhecido como redução da dissonância cognitiva).
Exemplos disso é quando, às vezes, passamos anos da nossa vida a falar mal de algo, tipo a coisa “X”, pois como de momento não temos essa coisa “X” na nossa vida, é mais fácil uma pessoa convencer-se de que não precisa dela (e em vez de ir buscar isso, evita isso, como no seu caso, a “ligação” com as pessoas).
Por exemplo, declararmos para nós mesmos que é impossível uma relação correr bem e que não vale a pena conhecer pessoas novas apenas porque ainda não encontrámos uma pessoa diferente do padrão habitual.
Aqui, geralmente a defesa psicológica consiste em fingir que não se quer aquilo que parecia impossível conseguir, pois era doloroso demais uma pessoa achar-se inapta para isso.
E de forma parecida, tenho pacientes que:
- Evitam expor-se pois acham que não merecem existir, quando no fundo são artistas e o que mais querem é divulgar o seu trabalho;
- Evitam relacionamentos amorosos em prol de sexo casual pois "não preciso de ninguém”, quando, no fundo, o que mais querem é aprender a vincular-se de forma duradoura com um parceiro;
- Evitam expandir e alcançar sucesso pois "quem sou eu para ter mais do que os meus antepassados?", quando no fundo querem ser empreendedores poderosos, cheios de recursos;
- Evitam ampliar os seus mapas mentais ou aumentar o seu vocabulário emocional, criticando e julgando outros homens que conciliam equilibradamente masculinidade e sensibilidade quando no fundo revelam uma profunda fragilidade e por vezes até uma beleza poética;
- Evitam aceitar a feminilidade e, na intimidade, serem sexy, pois isso é "sujo", quando no fundo sentem admiração e inveja por mulheres donas de si, do seu corpo, e da sua feminilidade.
Moral das histórias (e perguntinha para si no dia de hoje):
- O que é que você diz que NÃO QUER e NÃO É, quando no fundo, QUER sim, e quer SER esta coisa, sim?
Quando uma pessoa afirma que “tenho muitas dificuldades em ligar-me às pessoas” e ao mesmo tempo diz que “e isso entristece-me” está a evidenciar este “jogo” de dupla face em relação ao tema que colocou. Porque por um lado, percebemos que por algum motivo inibiu essa ligação com os outros (e se o fez, em algum grau e em algum momento “concluiu” que o tinha de fazer), mas por outro, esse motivo é de alguma forma adverso ou “forçado” para si e gerador de conflito interno, pois não se sente bem com ele.
Vejamos. Na realidade a relação ou a necessidade de “ligação” com o outro é a expressão de um profundo anseio humano. O anseio de sentir-se recebido, reconhecido e reafirmado na expressão genuína de seu Eu.
Ainda assim, a verdade também é que em algum nível todas as pessoas têm medo do amor, da ligação (emocional), e isso deve-se às experiências particulares da biografia de cada um de nós. No que toca ao amor, aos afectos, há sempre uma dualidade, pois a maioria das pessoas sente medo da verdadeira intimidade emocional e, ao mesmo tempo tem pavor de ficar sozinha.
E é precisamente esse medo que causa essa resistência emocional que muitas pessoas revelam.
Ora, o tempo vai passando e algumas pessoas acostumam-se a “não precisar”, a “não gostar” ou a “não se ligar” aos demais. Tal e qual um refúgio da dor, engendram uma reacção claustrofóbica à possibilidade de intimidade e justificam/racionalizam isso para si mesmas proclamando serem apenas pessoas “desapegadas” ou “desprendidas”.
“Ligar-se” ou “gostar” parece remeter a algum tipo de vivência negativa, como uma humilhação profunda, uma vergonha, frustração ou uma sensação de desamparo ou de “asfixia” ou sufoco emocional, as quais representam feridas de invalidação pessoal, de abandono e rejeição (geralmente, mascadas de auto-suficiência).
Se temos medo do abandono das pessoas a quem nos ligamos ou ligámos ou se receamos ligarmo-nos a alguém e perder a liberdade, acabamos por nos comportar, muitas vezes sem consciência disso, de maneira a sabotar toda e qualquer tentativa de relacionamento.
O que fazer em relação a isso?
Dir-lhe-ia que é fundamental reconhecer e buscar entender quais são os seus medos em relação ao amor ou ao vínculo com as pessoas, para poder começar a alterar certos padrões de sentimentos que levam a > pensamentos que levam a > crenças que levam a > comportamentos que levam a > hábitos que levam ao seu > destino.
Isso envolve analisar o quanto do medo em relacionamentos actuais tem a ver com relacionamentos passados – até mesmo (e talvez, sobretudo) as suas relações com pais, irmãos e pessoas que fazem ou fizeram parte da sua infância e que acabam por moldar o que buscamos (ou deixamos de buscar) enquanto adultos.
É na infância que aprendemos como os seres humanos se relacionam, e a partir do que vemos e vivemos, nós criamos as nossas próprias expectativas. É por este motivo que as crianças que vivem em ambientes hostis (de abuso, negligência e qualquer tipo de violência) podem ter dificuldades em relacionamentos futuros, inclusive no que diz respeito à confiança, com medo de depender ou de sofrer às mãos de alguém ou de se tornar responsável por outra pessoa (isto nos casos em que os pais demandavam mais atenção das crianças do que a que lhe dedicavam).
Quando os pais não se importam genuinamente com a criança (o que infelizmente acontece bastante), é possível que ela cresça a desenvolver um padrão vinculativo evasivo e ansioso: nestes casos, e pela vida fora, uma pessoa age como se não precisasse da atenção dos outros e, inclusivamente, foge quando essa atenção aparece.
Aprender a resolver e a remover padrões como estes, identificar padrões de pensamentos e crenças negativos na sua mente é muito importante para que a leitora possa compreender tudo o que o que se vem passando na sua vida, pois tudo o que somos (e o que a partir daí obtemos) está enraizado exactamente no nosso modelo mental, pensamentos, emoções e crenças, ou seja, tudo o que aprendemos desde a infância até aos dias de hoje, e que para nós é “verdade”.
Neste meu vídeo, disponível em baixo, irá entender porque é que por vezes acreditamos em coisas e temos como “verdades absolutas” aquilo que foi fruto apenas de um pensamento ou de uma emoção, ou situação momentânea, o de uma experiência mesmo de um condicionamento precoce, sem que essa “aprendizagem” seja actualmente válida ou mesmo correcta ou completa, em especial, se pretender alcançar coisas diferentes das que tem vindo a obter.
Saber do poder e da influência que o ambiente familiar teve na formação emocional de uma criança é fundamental para que esses padrões negativos possam ser quebrados e, assim, buscar novas formas e qualidades de relacionamentos. Em muitos casos, a terapia pode ser uma grande ajuda.
Então, e como abrir-se para relações humanas e aprofundar a sua ligação com as pessoas?
Para quebrar estas barreiras, uma pessoa precisa permitir-se de alguma forma entregar-se, necessitar, pedir e receber.
“Entregar” é confiar. Deixar ser. Como é. É entrega. E nós não sabemos ser entrega porque não admitimos sair do controlo.
A mente tensa irá sempre levá-la a desconfiar das pessoas, dos lugares e das situações. Quando uma pessoa menos espera, parece que entra numa espiral de questionamentos aparentemente pertinentes, mas na verdade só está desassossegada e cronicamente desarticulada (evitando ao máximo não se entregar).
Existe uma sabedoria muito grande entre os opostos de manifestação e aceitação. In and out. A onda que vem e a onda que vai. Inspiração e expiração. Surpreenda-se com essa entrega, essa confiança acrescida (se não a tiver, procure apoio profissional para a (re)construir) cada vez mais, colocando pé ante pé nesta corda bamba da vida, enquanto (re)aprende a caminhar pelas relações ao mesmo tempo que as laços e as “ligações” crescem dentro de si.
Com isso você também crescerá dentro da sua própria existência.
Para aprender a “necessitar” você precisa reconhecer o que deseja dos outros, das coisas e das situações, perceber, por exemplo, em que momentos ou situações precisa do carteiro, do padeiro, do canalizador, do vendedor, do recepcionista, do médico, do polícia, do amigo, do familiar, do vizinho, do(a) namorado(a), de si mesma.
A viagem ao centro de si mesmo(a) prossegue e a estação seguinte é (aprender a) "pedir”. Esta é uma das etapas mais delicadas, pois depende um pouco do outro, da reciprocidade que encontrar ou não. Daí o potencial de sofrimento ou felicidade. Quando os pedidos são claros, explícitos e comunicáveis, existe sempre uma maior probabilidade de serem atendidos. Caso sejam despropositados ou absurdos podem ser recusados ou não, dependendo que quem encontrar. Mas peça, se achar necessário. O pior cenário é seguir da mesma forma que já estava (talvez só com um pouco de desapontamento).
O último ponto, aquele que é aparentemente mais fácil, que seria "receber", para muitas pessoas está longe de ser uma coisa linear. Na verdade, tem muito que se lhe diga e de facto não é algo assim tão simples quanto se possa pensar.
É o típico “isto é bom demais para ser realidade” ou o “alguma coisa de mal deve estar para acontecer”, o “é melhor não aceitar para depois não ficar a dever” ou seja, uma notória sensação de problema pós-alegria. Esta é uma das denúncias de que não estamos à vontade ou de que temos medo (geralmente acompanhada com a sensação de falta de mérito pessoal) de receber.
Então, como seria uma boa maneira de receber sem sentir medo de perder ou ficar em “dívida”?
Receber com alegria e gratidão (registar o que de bom recebeu, por exemplo, num bloquinho de anotações, pode chamar-lhe o “Caderno do Eu”, se quiser!), deixar que “aquilo” recaia sobre si como uma bom duche de água quente. Nesse momento, foque-se em só receber, abrir-se, inspirar e expirar o acontecimento e deixar-se crescer internamente.
Quando todo este treino estiver bem engrenado, o que provavelmente você irá notar é que a sua aparente “dificuldade em ligar-se às pessoas” e o consequente “entristecimento” com isso deixarão de ser tão fortes como agora.
Eventualmente terá mais trabalho (pois claro!), nas relações em geral, no manuseio consciente e deliberado do seu apelo por se “desligar”, na contraparte de sofrimento emocional (tristeza) que tal acarreta e depois caberá gerir, pois irá envolver-se, correr riscos (mais ou menos calculados), correr o risco de ser afectada e isso dependerá de todo este empenho, e sobretudo correr o maior risco que talvez mais valha a pena nesta vida: o risco de/para amar e ser amado(a).
A mente que fica o tempo todo a definir-se a si própria (e aos outros) pelo que aconteceu no seu passado não se consegue livrar de toneladas de dor acumulada.
Faça o que tem que fazer para entender e ressignificar o que precisa do passado. Fiz, inclusive, um vídeo no qual lhe ensino a ressignificar as suas memórias negativas e descobrir como fazer um verdadeiro “reset” mental num passo-a-passo (de 5 etapas) acompanhado por mim (onde inclusive dou um relato pessoal). Poderá aprender aqui no vídeo em baixo:
Esteja pronto(a) para o seu novo Eu desapegando-se do antigo. É isso que o(a) fará crescer. Mas lembre-se que o foco é ter quantas identidades forem necessárias até morrer.
Por exemplo! Quando sai da casa dos pais, nasce um novo Eu. Quando troca de carreira: um novo Eu. Quando se relaciona: um novo Eu. Quando se torna mãe ou pai: (re)nasce um novo EU!
Um novo Eu a cada vez que precisa percepcionar-se de forma diferente para dar conta do recado.
A felicidade e a preguiça não andam de mãos dadas.
Mas o que eu noto é que as pessoas estão mais tristes e isoladas, e a morrer de medo de gostar ou conectar-se (realmente) com alguém. Preferem nem entrar na brincadeira para não sofrer depois. Vivem tudo pela metade e privam-se do “brinquedo” por achar que ele se irá partir ou ser roubado. Resultado catastrófico, pois a nossa pele precisa de contacto físico e a nossa alma precisa de contacto e conexão emocional.
Desligue o “piloto automático”, tome consciência do que está a fazer agora mesmo. Respire fundo, olhe para alguma pessoa que esteja ao seu lado e faça-lhe uma pergunta intrigante ou curiosa, como algo do tipo: “qual é o teu/seu maior sonho na vida?”
Depois conte-me como foi. ;)
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